Em um ano e meio como titular da lateral esquerda do Flamengo, Filipe Luís acumulou títulos — e treinadores. Após a passagem hipervitoriosa do português Jorge Jesus, o time foi comandado pelo catalão Domènec Torrent, demitido depois de pouco mais de três meses. Agora, sob a orientação de Rogério Ceni, o Rubro-Negro se apega à esperança de conquista do Campeonato Brasileiro para evitar que uma temporada promissora termine sem conquistas de peso.
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Em entrevista ao jornal ‘O Globo’ antes da virada do ano, o jogador analisou os perfis dos três profissionais que o orientaram no Ninho do Urubu. E, na versão exclusiva para assinantes, revelou detalhes da preparação para se tornar, ele mesmo, um treinador.
O que mais ficou da passagem de Jorge Jesus?
Jesus é muito completo. Com ele, era assim: o time jogava no 4-4-2, com Gabigol e Bruno Henrique na frente, Arrascaeta e Everton Ribeiro vindo por dentro, saída de três com Arão, laterais sobem… Eu te falando isso dura dez segundos, mas para ele são quatro treinos. Quando a bola vai no Rafinha, o Filipe fecha para dar sustentação por dentro e o Gerson vai para frente. ‘Ah, beleza, mas o Rafinha foi na linha de fundo. É só isso?’ Não, quem entra na área? Entram Bruno Henrique, Arrascaeta, Gabigol, e Ribeiro vai por dentro. Filipe Luis e Pablo Marí vão marcar os atacantes, e o Willian Arão vai compensar o Rafinha. Isso tudo numa cobrança excessiva. Se o Rafinha fosse cruzar e eu não estivesse marcando o ponta direita, era uma dura extraordinária. Se o Gerson saiu para pressionar e a última linha defensiva não acompanhou, ele cobrava com vídeo. Era muito detalhe, e ele ia falando em todos os treinos e todos os dias. E tinha outra coisa: ele transmitia para a gente que ele era o melhor treinador do mundo e inventou o futebol. Era mais ou menos isso. E o jogador gosta de escutar isso. Diziam que ele era arrogante, pode ser. Quem não é flamenguista achava. Mas quem estava lá, pensava: ‘Não é que ele é bom mesmo, que ele sabe mesmo…?’. Talvez tenha sido o mais meticuloso, detalhista, completo que eu tive.
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Então a ideia da liberdade total ao atacar não é correta?
Era tudo treinado. Os movimentos pelo lado, com um terceiro homem (junto a lateral e meia) atacando o espaço… Eram uma exigência. O jogador gosta da bola no pé, tocar, fazer tabela. Ele quer o cara no espaço. O Arrascaeta, por exemplo, resolveu o jogo contra o Grêmio [ida da semifinal da Libertadores] saindo da ponta esquerda, indo na ponta direita e cruzando. O Jorge Jesus gostava disso? Não gostava. Mas quando dava certo, ele mandava continuar. O Arrascaeta tem muito dessa característica, ele é anárquico, cria desequilíbrio ao encontrar o espaço dele e fazer uma genialidade. Ele vai cortar isso? Não. Mas tinha jogos em que ele precisava do Arrascaeta aberto, e ele não estava lá. Não era liberdade total, mas ele libera a criatividade do jogador.
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Houve tempo para extrair alguma coisa do trabalho do Dome?
Ele fala muito do Messi, tem muito vivo o Guardiola dentro dele. Falar que deu errado, que não sabe nada… Não! O Dome sabe muito de bola. Ele veio na hora errada, não tenho dúvida. Qualquer um que viesse depois do Jesus seria na hora errada, mas tem muitas coisas boas. A única coisa de que senti falta era de definir um sistema de que ele gostava e dizer para nós: vamos jogar assim, do jeito que eu quero. Ele gostava de jogar num 3-4-3 ou 4-3-3 e não tinha pontas no estilo Douglas Costa, Coman… Então, talvez ele não tenha podido fazer o sistema que queria pela característica dos jogadores. Mas se tivesse feito assim, falado que a gente ia jogar no 4-3-3 e ele iria ensinar para a gente o sistema, talvez tivesse dado certo. Mas ele tinha uma saída de jogo excelente, estudo e pressão no adversário excelentes, ele é muito bom. Mas veio na hora errada. Pegou lesões, Covid… Mas aprendi muito com ele.
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E o Ceni?
Mais do que paizão, é um amigão da gente. O Rogério é o que mais parecido joga com o Jesus. O 4-4-2, com algumas ideias diferentes. Sob esse aspecto do cara que vive o futebol 24 horas por dia, Rogério é igual ao Simeone. Ele está começando, tem quatro ou cinco anos, mas já está mais cascudo do que quando estava no São Paulo: entende mais o jogo, soluciona problemas. Na Libertadores, fomos eliminados, mas com um a menos empatamos o jogo pelas trocas dele. Com o passar dos anos, ele tem potencial para chegar à seleção.
Por: Extra